Quem sou eu

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- O que escrevo? Não sei. Só sei que minha alma grita e eu já não posso mais abafar nem conter essa ânsia.

segunda-feira, abril 26, 2010

A espera de uma reconciliação

São seis horas da manhã e ainda estou acordada. Lá fora o dia está amanhecendo. Com um pouco de dificuldade, encoberto por nuvens carregadas, os primeiros raios de sol tentam iluminar o céu, que, nesta noite - quase manhã - está desacompanhado das estrelas.
Janelas no prédio ao lado fazem barulho. Olhos que se abrem com o mesmo desejo de permanecerem fechados não são meus. Os meus acompanham atentamente os passos no andar de cima. Hora o menino corre para tomar o seu leite, hora corre para não perder a condução. 
Os meus passos estão cansados. Prontos para mais um amanhecer na solidão de uma cama vazia, num quarto frio, acompanhada, apenas, por uma linha não preenchida. Por um nome que não posso marcar. Não é mais meu. Por dois passos que tentarei dar amanhã...
Porque o novo dia só começa, para mim, quando o outro termina com o fechar dos olhos meus. E, esse dia insone terá um pouco mais de duração. Até que meus olhos estejam cansados de tanto te esperar.

domingo, abril 11, 2010

Domingo no Sertão

Para alguns, domingo tem cheiro de preguiça, de um descanso exagerado. Para mim, domingo tem cheiro de saudade, de uma melancolia, que torcendo muito, só se arrasta até a próxima quinta-feira. Lembro-me de que na meninice o domingo era sempre o dia mais esperado na semana. A casa cheia, comida em excesso cozinhando no fogão à lenha, crianças correndo soltas pelos cantos da casa – meus nove irmãos -, vizinhas trocando receitas de fim de semana, o cheiro do feijão na panela de ferro e o cheiro do fumo misturado a uma colônia forte de menta que papai usava.
Domingo tem cheiro de bagunça, de risadas altas, de família reunida - de brigas. Mas em casa, na hora do almoço, papai rogava aos céus em silêncio uma prece que só ele sabia de cor, mamãe fechava os olhos, submissa, e compadecia-se sei lá bem com o quê. O silêncio era o nosso companheiro na hora das refeições. Seu Nicanor não permitia um ruído sequer, dizia que aquele momento deveria ser preservado, aproveitado e admirado em silêncio. Comida era sagrada lá na nossa choça. Podia faltar o que fosse, podíamos não ter mais velas nem pilha para ouvir no rádio as tragédias de nosso sofrido Sertão, mas papai não deixava que nos faltasse uma refeição que fosse. Mesa comprida ocupava praticamente todo o espaço da sala, e ali ficavam as comidas bem feitas, bem temperadas e cozidas por minha mãe, Sebastiana.
Domingo tem cheiro de feijoada, tem cheiro de silêncio, tem melancolia, tem saudades de minha terra querida.
            Depois do almoço os filhos mais velhos ajudavam a mãe com as louças, enquanto os outros se distraíam brincando na rede no lado de fora. Eu não ajudava nem brincava. Era a quinta filha, o quinto degrau dos irmãos. Não era velha o suficiente para lidar com a louça nem nova o bastante para brincar na rede. Sentava-me no degrau da porta e observava, mais a frente, meu velho Nicanor postado em sua cadeira de balanço com o olhar fixo não sei onde, as mãos cruzadas sobre o peito magro, porém forte, e no canto da boca o fumo apagado, seu enfeite, sua única regalia, sua única extravagância.
            Quando a cozinha já estava impecável, mamãe não descansava, contudo. Varria a frente da casa, aquele piso sem cor, gelado que cheio de areia a irritava. Papai fingia nem perceber sua inquietude, pigarreava a garganta e mais fixo ainda penetrava seu olhar passando a cerca, passando as árvores que ainda restavam, passando as nuvens, passando o horizonte.
            Domingo. Ah, os domingos de meu Sertão. Ainda sinto o cheiro do fumo molhado, do feijão cozinhando na panela de pressão, da lavanda de seu Nicanor, do silêncio. Oração sem pressa que nos conduzira durante tanto tempo a uma mesa farta, a um carinho sem apego nem afago mas sentido dentro de nossos corações. Ah, meu Sertão de tantas mazelas e sofreguidão. De tanta seca e insolação. De tanto cheiro de amor, cheiro de domingo de fé, cheiro da saudade de um tempo que nunca mais voltou. Ah, meu Sertão.

quinta-feira, abril 01, 2010

Um pedido

                                             (À ., que o passado não seja apenas uma sombra na qual te acomodes em apenas sobreviver à margem dela.)

Dizem que o tempo é o melhor dos remédios, mas em teus olhos, anuviados de mágoas passadas, é apenas a sombra daquilo que sobrou; daquilo que hoje faz parte de ti. Tão calejada, tão amarga. Tão azeda e tão segura de si!

O tempo te fez aprender na marra a respirar todos os dias, a embalar o teu filho e colocá-lo no berço sozinho, sozinha; com todo o peso do mundo nas costas... E é por causa do tempo que as sombras do que já se foi resolveram despertar das cinzas de um amor que se queimou. Tão sofrido!

“Desperte, Coragem!” - soou como uma gota de lágrima de que há muito lhe fora extirpada de tua alma.

Reascenda as chamas do amor e arranque de uma vez por todas essa armadura de que te vestes. Já não há mais motivos para fugir e fingir ser quem não és. A dor tomou conta do teu coração, bem o sei, mas ande! reaja! Contudo, antes de qualquer coisa: perdoe-se. A vida precisa de um recomeço, uma segunda chance, e o tempo de dor precisa ser deixado no que já se foi.