Quem sou eu

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- O que escrevo? Não sei. Só sei que minha alma grita e eu já não posso mais abafar nem conter essa ânsia.

sábado, janeiro 31, 2015

navalha do desprezo

engolir a navalha do barbeiro
que de corte em corte afia
o fio daquela lâmina
ora envolta de uma toalha
de linho branco e macio
ora cortando o mal pela raiz

engolir a navalha do barbeiro
a seco mesmo
deixar tomar a reta
arranhando e rasgando
e sangrando a garganta

depois jogar por cima
beber querosene e riscar
um fósforo goela abaixo
deixando o produto agir
e beber de novo
até queimar
até não restar mais
monossílaba de horror

te juro: doerá

mas doerá bem menos
do que o teu habitual desprezo

para contigo mesmo

sexta-feira, janeiro 30, 2015

repeat

              (para gal costa)

quando as horas
de um dia
me doem mais
e ultrapassam as horas
em que só me encontram
debaixo das cobertas
nuvem negra toca – com a incidência
das ondas sonoras da minha pulsação

deito minha dor sobre aqueles
quatro minutos e trinta segundos
vezes dor elevada à quinta potência
de pura melancolia acompanhada

nossas dores se confundem
ela canta e eu me retorço
com a dor que é melódica
em tons de vermelho
que só eu sei

excelência dessa vida: é doer-se
e continuar vivendo
apesar de 
cada nuvem negra 
que se forma em meu céu

ao som de gal costa – nuvem negra

quarta-feira, janeiro 28, 2015

catástase poética

dentre todas as solidões
com que me parisses
a poesia foi a melhor delas
com sombras

mas sem dúvidas

sábado, janeiro 24, 2015

o sorriso da lua

a brevidade do voo
tem o pouso noturno
nos cabelos de luz
dessa noite

a lua minguante
sorri enquanto sonha
de frente para a tua janela

quinta-feira, janeiro 22, 2015

o poeta em constante queda livre

o amor é uma janela
na qual só os poetas
têm coragem de
se debruçar
correndo o risco
da queda livre

⊷ ⊶

o suicídio do poeta
é amar em demasia

quarta-feira, janeiro 21, 2015

o proprietário da nova senzala

a raça
arrasa
carne vendida desde
antes da fome
hoje
apetece ao olhar
desejo íntimo
não impugna a podridão humana

quer cheirar, lamber, comer
açoitar e escravizar
a carne negra

a mulher preta
coberta de purpurina e tinta
samba na tevê
porque a raça samba
todos sambam
devem sambar

a raça arrasa
arrasta o pé
sola branca
gasta servidão que o fundo
dos olhos testemunhou

a raça deve isso:
ao homem branco
divertir e aguçar os sentidos

porque ele é homem
o preto: é raça
mercadoria
satisfação do desejo
sacia a fome
faz o brilho da lua
ressaltar na pele escura

mas não come à mesa
abaixo dela o cachorro
vira-lata
a nova senzala é a televisão

o senhorio: eu 

terça-feira, janeiro 20, 2015

versos espaços perdidos na solidão dos pássaros

atue na minha força
repulse na minha ânsia

               

a depressão
depressa
depreda

               

a vida resiste
onde o amor existe


em súplicas relaxos e poesia
continuo eu labuta
na vida ocre e linda
à minha própria procura

sábado, janeiro 17, 2015

a infertilidade do verso vazio

             (para isolda campos)

eu fadada à escuridão
repouso a mão sobre o ventre
murcho

há na madrugada
a morte anunciada
do poema faminto
                            
a lágrima caligráfica
de uma vida infecunda
e o amor demorado
ocupam esse imenso e atordoado
espaço-vazio

eu penumbra e sombra
um vestígio de verso
suponho a morte
à chama derradeira
da palavrangústia

vertigem que sangra
sobre o poema nulo:
sou o corpo devorante
dessa existência que se ausenta
úmida e só



sexta-feira, janeiro 16, 2015

isolda campos

os olhos já não lacrimejam
como antigamente
a garganta agora em carne viva
fere cada palavra pronunciada
o ventre seco
já não compõe mais

quinta-feira, janeiro 15, 2015

a sina de todo poeta

          (para diego moraes)

eu querendo cartas
juras de amor
embebidas no teu perfume
recebo telegramas
ordem de despejo
com marcas de dedo sujo

quarta-feira, janeiro 14, 2015

leveza sobre a mesa

mirar a rima
que dança solta
numa festa lá na china
           
...

soltar a pipa
que a criança sorri
enquanto faz xixi

...

o vento faz a dança
do leva e traz
as cadeiras giram soltas no ar

...

tudo é leveza
quando se acorda
o papel em branco sobre a mesa

terça-feira, janeiro 13, 2015

o silêncio do verbo que reverbera

esse verbo
não dito
consome a noite
insone de ti
qualquer coisa
ainda que distante
traz à memória
o cheiro guardado
do poema esquecido
a cama feita
o lençol esticado
a lua iluminando
o chão com o teu nome
a importância e a delicadeza
das tuas horas
idas ao meu lado
eu evoco a ti
evoco tua rima cansada
e tu despontas
na versificação romanesca
do nosso passado
tudo passado em branco
tudo passado a limpo
o poema jaz emudecido
na lembrança
do nosso quarto adormecido
eis o silêncio:
o verbo que restou de mim

sexta-feira, janeiro 09, 2015

t r a n s p i r a ç ã o poética

transpiração
transpiração
transpiração

aspiração

transpira ação
transpira ação
transpira ação

poesia cardíaca
sua e agita
/agito e uso

poesia
minha droga (ilícita)
conforme a crítica

terça-feira, janeiro 06, 2015

poemeto da confidência

canta o pássaro 
de cima do galho
/a árvore tudo sabe
confidente


praia do laranjal, 2014, 27 dez

sexta-feira, janeiro 02, 2015

rito de passagem



sigo
com
cuidado
mal
consigo
paro
acordo
recomeço,
cuidado

tenho
o passo firme
o coração leve
sigo
e só me entrego
se for amor



praia do laranjal, 2014, 28 dez