Não culpe os outros
Quando há um desentendimento,
Quando houver hesitação de palavras
E a consequência for o não dito.
Não os culpe.
Há criaturas que precisam
Da comida mastigada
Para que possa ser digerida
Há inocentes que não
Mantêm o corpo ereto, pois
Embora adultos, necessitam
De um suporte, de uma muleta.
Há também muitos
Alunos da escola da vida
Que não absorvem o sentindo
Das orações incompletas;
Não assimilam a terceira pessoa do singular
Quando o referido sujeito
É o próprio locutor.
Não os culpe, deve ser coisa de genética
Ou uma peste viral
Imune à idade, à maturidade,
À instrução acadêmica.
Por tanto, seja paciente, não os culpe!
A maioria de nós
Precisa da fórmula matemática
Exposta no papel
Ou articulada na ponta da língua do professor
Caso contrário não resolverá a equação.
Não dará início à jornada aritmética.
Não culpe os pobres humanos,
Pois somos tantos
E os dizeres imaculados em uma discussão
Ou conversa sincera são os mais prejudicados
Já que não são usufruídos, não são ditos
Ficam revirando-se nas redes neurais,
Aumentando a pulsação sanguínea irritada,
Sobrando as meias palavras
A interpretação incompleta,
Recortada, mal articulada e tramada;
Sobram as descontextualizações verbais,
O enunciado truncado,
O sentido subvertido pelo funcionamento
(ir)racional do interlocutor,
Falta a tal polifonia,
A desconversação metafônica e metafórica.
Não os culpe, pobres humanos!
Há que se fazer um desenho
Da coisa toda não dita
E presentear o companheiro outro
Porque os mortais racionais e incrédulos,
Os que não observam a semiótica do corpo que fala
Sem pronunciar palavra,
Só entenderão o implícito
Quando esse estiver
Nas suas fuças
Como este traçado
Que acabo de esfregar na tua cara.